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Réquiem para Dona Lisa



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Na minha cabeça, existe uma igreja só minha. Nela, não há imagens de mármore nem bancos de madeira. Há vibrações e sentimentos derivados. E se cultua o DeusSom — divindade que a todos abraça e acolhe.

Foi nessa igreja íntima que nasceu a construção sonora que preparei intuitivamente para o serviço de luto da minha mãe — a quem eu chamo, com afeto e respeito, de Mãinha. Essa despedida também me foi sonora, pois assim entendo tudo melhor. As sinapses se formam com clareza e sensibilidade. Uma linguagem muito pertinente e que me faz total sentido.

Quis criar uma atmosfera que acolhesse sua personalidade amorosa, ao mesmo tempo em que trouxesse conforto ao momento da partida. Que desse espaço à tristeza, sim, mas que não deixasse o amor se perder. Uma trilha musical que fosse abraço e oração, saudade e boas lembranças – que tivesse a força de dizer OBRIGADO. Um réquiem não triste, mas cheio de beleza e sensibilidade — como ela merecia.

Ato 1 – Despedida e Conforto

No espaço de velório, com uma pequena caixa de som, colocada no canto do espaço, num tom sempre baixo. Iniciei com sons em 528Hz, frequência associada ao amor universal, à regeneração, ao equilíbrio. Essa vibração é conhecida por acalmar o sistema nervoso e abrir clareiras internas — como se o tempo suspendesse a dor para que a saudade e o amor pudesse se manifestar com doçura.

Cerca de uma hora depois, dei play numa playlist que tocava para ela, chamada “Mãinha Curte”. Brincava que era “para acalmar a leoa”. E funcionava. Mãinha elogiava com um sorrisinho: “quanta música bonita”. Fiz uma pré-seleção das canções que ela gostava. Evitei os ritmos latinos e pop mais dançante que sempre a fizeram sorrir e querer dançar — porque entendi que era momento de nossas mentes lembrar do carinho e da honra mútua. Dentro do que ela tanto apreciava, permaneci com melodias suaves, letras acolhedoras que tocam a alma e a ternura das vozes que ela reconheceria.

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Teve Laura Pausini, Djavan, Eros Ramazzotti, Morcheeba, Sting, NSYNC, Nek, Luis Miguel, Luan Santana, Adele, Maria Bethânia, Sade. Durante 04 horas, a música entrou como incenso, como brisa, como presença.

Ato 2 – Tudo Novo De Novo

No teatro, ao iniciar a cerimônia de cremação, o cerimonial nos apoiou na construção de uma linda homenagem a ser projetada para os presentes. Para isso, nos foram solicitado um certo número de imagens que pudesse contar um pouco da trajetória de dona Lisa. Que indicássemos 03 músicas que servir de fundo na apresentação dessas mesmas imagens:

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01 – Abrirmos com “Tra Te E Il Mare” (Laura Pausini), pois vem dessa paixão de mãinha por Laura. Lembro de quando eu disse a ela que era minha música preferida de Pausini, me respondeu: “Não sei dizer qual a música dela que mais gosto. Mas concordo que ‘Tra te e il mare’ é uma das mais bonitas mesmo”.

02 – Depois, outro grupo de imagens teria como trilha a canção “Happy” (Lighthouse Family), que me remete ao tempo que ela adorava assistir clipes com legenda traduzida. Nesta canção tem uma frase que associo a personalidade positivista que dona Lisa tinha: “Quem disse que você não pode ser feliz o tempo todo? Diga o que você quiser, mas eu ainda vou tentar”.

03 – As imagens finais foram alinhadas com a canção do artista brasileiro que mãinha mais elogiava, que era Djavan. Escolhi a faixa “Oceano”, que além de ser um marco no carreira deste letrista e instrumentista, traz a simbologia da impermanência, pois dona Lisa agora volta a ser oceano, volta a ser terra. A morte não é fim, mas sim transformação. Um retorno à fonte de onde a vida surgiu.

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Fugindo um pouco dos protocolos do serviço de luto, tive o acolhimento da cerimonialista (Raquel) que me colocou em contato direto com o profissional que estava por montar a apresentação (Diego). Mostrei um projeto digital que vinha construindo, que foi gravar dona Lisa em diferentes locais, lendo uma letra de música, de diferentes autores e estilos. Um microfone acoplado ao meu celular e que eu incorporava a aventura de ser diretor de audiovisual. Publicados no Youtube, são 14 vídeos curtos, onde ela declama as canções de Lenine, Roberto Carlos, Marina Lima, Pedro Mariano e até Nina Simone. Essas gravações, estão reunidas num álbum que chamo de #ApaziguadoraUrbana – um personagem social que tem a clara habilidade de reunir pessoas e gerar um tipo de co-criação de ideias e integrando o apoio ao outro. E apesar dela estar lendo, na minha cabeça continua sendo música.

Deste cenário de vídeos, capturei os links para “Gente Aberta” (Erasmo Carlos), pois representa o posicionamento claro sobre quem sempre preferiu o caminho do amor, da conversa. Depois vem a canção “Dono de Mim” (Pepeu Gomes), uma mensagem que traduz essa força incessante que habitava dona Lisa e que não a deixava parar frente dificuldades ou lamentos. Para encerrar, “Tudo Novo De Novo” (Paulinho Moska), que foi a primeira captação que fizemos – lembro que nos encontramos já na frente da praia. Ela estava fazendo sua caminhada e quando propus de fazermos a experiência, ela topou na hora. Dentro da montagem que Diego criou, tivemos um lindo e comovente resultado final que pode ser visto através desse link a seguir: Homenagem Juelisia Soares Galasso

Esses fragmentos de voz e afeto, entre o mar e a cidade, entre a vida e o depois, deram à despedida uma aura íntima e potente — como se, por alguns instantes, a arte tivesse o poder de suspender o tempo e reafirmar que Dona Lisa não partiu, apenas mudou de lugar.

Foi aí que compreendi, mais uma vez, o poder silencioso da música. Ela não interrompe o choro, mas o acompanha. Não apaga a ausência, mas dá contorno à saudade. No velório de Mãinha, a música foi colo e abraço. A sonoridade foi uma ponte entre o que fomos, o que somos e o que continuaremos sendo — mesmo sem ela aqui.

Assim, nos despedimos da mulher que ensinava o amor e a conversa. Que dançava, que lutava, que cuidava. Que agora, mora para sempre na acústica do meu coração.

Este é o meu Réquiem para Dona Lisa.

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Eterno, como a música.

Leollo Lanzone


Leollo Lanzone

Leollo Lanzone é o alter ego de Mauro Galasso, que é de verdade, mas não cabia numa persona só. Tem olhar objetivo e sensível, tem o hábito de montar playlists, adora dançar eletrônico, sabe cozinhar, falar de amizade e tem opinião sobre quaaase tudo.


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